A busca pela nova liderança feminina — Gama Revista

Uma turma

A busca pela nova liderança feminina

Indicar, apoiar, investir. Essa é a estratégia destas mulheres para aumentar a liderança feminina nas empresas

Isabela Yu 29 de Março de 2020
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    Vivi Duarte

    Fundadora do Plano Feminino e do Instituto Plano de Menina

    Vivi Duarte cansou de ouvir que “a propaganda precisa de licença poética” quando trabalhava como executiva de marketing e cobrava representação de gênero e classe nas campanhas. Foi ali que se sentiu saturada do mundo da publicidade e criou o Plano Feminino, uma consultoria que tem como missão mudar a narrativa da publicidade em relação às mulheres. Entre os trabalhos, atendeu empresas de grande porte como a montadora Jeep e a cervejaria Heineken para que ficassem mais diversas em sua comunicação e no ambiente corporativo.

    Conforme a sua empresa aumentava, também alargava a vontade de educar a próxima geração, muitas vezes vulnerável pela falta de oportunidade. Assim surgiu o Instituto Plano de Menina, que já atendeu 2 mil meninas de dez estados com cursos de capacitação e conectando-as a grandes empresas desde 2016.

    De 2010 até 2020, o caminho foi árduo porém recompensador. A empreendedora vê mudanças desde então mas diz que ainda é necessário combater a “sororidade seletiva” e furar a bolha. “Quando falamos de líderes, a quem estamos nos referindo? Certamente não é da mulher negra. Precisamos exigir mudanças. Essas mulheres em cargos de liderança precisam tomar atitude e usar seus privilégios para abrir espaço para mulheres negras”, afirma.

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    Carine Roos

    Co-fundadora do programa ELAS e da consultoria UP[W]IT

    Uma das frases preferidas da empreendedora vem do livro “O Momento de Voar”, da cientista Melinda Gates: “Investir em uma mulher é investir na comunidade, pois todos prosperam”. Ao longo de sua carreira no mundo corporativo, Carine reconhecia a desconexão entre o que lhe era falado e o que via em suas colegas de trabalho. “Já ouvi que as mulheres não são ambiciosas o suficiente, não têm inteligência emocional, não são boas com números. E que por isso há poucas no comando”, lembra.

    Depois de duas décadas ouvindo essa ladainha, Carine, ao lado da hoje sócia Amanda Gomes, resolveu criar um projeto para fomentar a liderança feminina em mercados ainda dominados por homens, como tecnologia, ciência, engenharia e matemática. Fundaram o Programa ELAS — Escola de Liderança e Desenvolvimento, que trabalha para que elas ocupem posições de destaque a partir destes pilares: visão, autoconhecimento e tomada de decisões.

    Para a empreendedora, o debate já mostra sinais de amadurecimento graças ao acesso à informação, principalmente com o debate recentes sobre casos de assédio sexual e a síndrome da impostora (sensação de falta de pertencimento e merecimento). Ela lembra que o que está por trás desse sentimento de inadequação vem da construção social equivocada de que essas profissionais não são boas o suficiente. “Parece que nunca somos inteligentes o suficiente para dar um passo na carreira. Falta um curso, uma especialização ou aprimorar o inglês.” Para contornar esse cenário, ela sugere, é preciso estabelecer metas, ter clareza nos objetivos e dar um boost de autoconfiança nessas profissionais — identificar talentos e reconhecer trajetórias e conquistas.

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    Ana Fontes

    Fundadora da Rede Mulher Empreendedora

    A professora, empreendedora e ex-executiva tem um desejo para os próximos dez anos: não precisar do trabalho de ativismo e fazer dos negócios o foco da Rede Mulher Empreendedora (RME), que conta com 750 mil mulheres participando de eventos, mentorias e programas de capacitação.

    Mas ele parece longe de se realizar, a começar pelo que sentem as mulheres. Apenas 35% das mulheres se sentem confiantes, contra 50% dos homens, de acordo com pesquisa desenvolvida pela RME. “O ambiente corporativo é hostil para as profissionais que têm filhos pequenos. Há inúmeros casos de mulheres que são despedidas ao voltarem da licença maternidade. Não há jornada flexível e as empresas as enxergam como fardos. Então, muitas passam a empreender nesse período.”

    Mas aí há novos desafios: o difícil acesso a crédito, a falta de educação financeira e de políticas afirmativas para que elas entrem em um novo mercado. Isso sem falar no lado doméstico, com o desequilíbrio nas tarefas em casa.

    Um dos trabalhos da RME é conectar essas empreendedoras com grandes empresas. “A rede era algo que eu fazia no meu tempo livre, uma plataforma de recomendação, de troca entre outras mulheres que também estavam empreendendo e passando por dificuldades”, lembra Ana. A iniciativa deu tão certo que, depois de 20 anos como executiva, hoje é seu trabalho principal.

    Mas o RME faz mais que conectar, ela abrange desde o ensino de negociação à capacitação de mulheres em situação de vulnerabilidade. Um dos maiores orgulhos da fundadora é o treinamento de líderes locais, multiplicadoras espalhadas pelo país, que realizam oficinas para outras empreendedoras. “Desde mulheres trans, egressas do sistema prisional, mulheres indígenas. Uma multiplicadora venezuelana fez a tradução do material e organizou uma turma em Roraima. As histórias são de chorar”, conta.

    O foco delas é também mudar a cultura organizacional dos negócios pela conscientização sobre o racismo no Brasil; e trazer propostas para tornar o ambiente empresarial mais receptivo às profissionais negras.

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    Amanda Abreu

    Co-fundadora do Indique uma Preta

    Neste primeiro ano como uma consultoria formal, o Indique Uma Preta atua em duas frentes: reunir mulheres em cursos e palestras e conectá-las à empresas. Em um grupo do Facebook, que foi onde o projeto começou, em 2016, mais de 5 mil mulheres trocam serviços, vagas e experiências pessoais.

    As sócias, as publicitárias Amanda Abreu, Daniele Mattos e Verônica Dudiman, apontam que há um clichê para explicar um quadro de funcionários majoritariamente brancos: a justificativa mais ouvida é que não há pessoas negras qualificadas para o cargo. “Em um país onde mais de 50% da população é negra, com centenas de iniciativas que ajudam no desenvolvimento de grupos vulneráveis, políticas afirmativas nas universidades, um argumento desses é inadmissível”, afirma Amanda.

    Quando são chamadas a uma empresa, o foco do trio não é no recrutamento, mas em diagnósticos de diversidade para definir uma estratégia de “sensibilização” e treinamento. “Quando mentes com diferentes backgrounds pensam soluções para o mesmo problema, é mais fácil de atingir um resultado inovador”, defende.

    O cenário de equilíbrio racial ainda é distante nas posições de chefia. Amanda cita o artigo “Enegrecer o Feminismo: A Situação da Mulher Negra na América Latina”, de Sueli Carneiro, para falar sobre a dinâmica desigual: “É preciso de muita cautela para não acharmos que a questão de gênero está resolvida, precisamos levar em consideração os recortes de raça, classe e sexualidade”.

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    Nina Silva

    Co-fundadora do Movimento Black Money

    Há 70 mil resultados com o nome de Nina Silva no Google e, há dois anos, a empreendedora foi reconhecida pela ONU como uma das 100 personalidades afrodescendentes com menos de 40 anos mais influentes do mundo. Mas nem por isso ela deixou de sofrer preconceito: durante muitos anos, por mais que tivesse uma performance melhor, os homens brancos recebiam salários mais altos que o seu ao longo dos 17 anos em que atuou no mercado de TI.

    Ao lado do sócio Alan Soares, desenvolveu o hub de inovação Movimento Black Money, que busca a inclusão e autonomia financeira da população negra. Inspirados no pan-africanismo, desejavam criar recursos para que o capital financeiro circule pelo maior tempo possível na comunidade negra.”Nosso objetivo é gerar nossa própria cadeia produtiva, de fornecimento até consumo consciente e intencional de produtos e serviços de negros”, explica Nina.

    A iniciativa gerou ramificações, como a Afreektech, que tem foco educacional, e produtos como a Pretinha, uma máquina de cartão. Neste ano, lançam ainda o Mercado Black Money, um serviço de mercado para afroempreendedores. “Precisamos circular o nosso capital, criar um funding preto, dar crédito e aumentar a empregabilidade.”

    Hoje em dia, segundo números do MBM, os afrodescentes representam 56% da população brasileira, 53% dos micro e pequenos empreendedores, 67% dos desempregados e movimentam R$ 1,7 trilhão por ano.

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